Passou da meia-noite e já é dia 20. Mas aqui há duas horas e meia ainda estava sentada nos vermelhos e almofadados assentos do Grande Auditório da Culturgest, para os primeiros dois documentários em competição no festival. O DocLisboa 2007 começou dia 18 mas foi o 11 de Setembro a 19 de Outubro que deu o mote. Confusos? O Festival tem várias iniciativas, como a competição internacional e nacional (selecção de alguns dos mais importantes longas e curtas metragens produzidas em 2006 e 2007), ensaios, MasterClasses, sessões especiais variadas, entre outros. Os filmes que vi ontem foram "My 9/11" e "Jesus Camp", os primeiros filmes da competição internacional do DocLisboa.
"My 9/11" é uma curta metragem de Tjebbo Penning, um realizador alemão que vivia apenas a alguns quarteirões de distância do WTC quando se deu o atentado. Na altura ele via um jogo na televisão e ouviu um barulho que se afigurou um buraco fumegante no WTC, "apenas". Não ouviu gritos, nem sangue, nem pessoas em aflição. Os seus amigos ligavam-lhe e deixavam mensagens no atendedor, alarmados, preocupados, mas de onde se encontrava, estranhamente, não se sentia assustado. Viu o segundo avião embater na segunda torre, mas o atentado não o chocou particularmente até o pó cobrir as ruas e uma folha que reconheceu do WTC ter voado pela janela até sua casa. É um documentário visual, pausado, respirado. Contrasta com os frenéticos filmes que têm saído sobre o atentado; lembra-me quando recebemos uma notícia má e simplesmente ficamos apáticos, ou quando toda a gente transforma um copo numa tempestade porque caiu da mesa, mas nós não vimos as cascatas do Niagára pelo chão da cozinha.
"Jesus Camp" é uma longa metragem sobre um campo de férias para crianças organizado pelo movimento de cristãos evangelistas americanos. A sua cabecilha, Betty QualquerCoisa, é uma fanática "bem constituída" que prega contra os "obesos e preguiçosos católicos do nosso país". Esse momento do seu sermão deixou a plateia em risos, como seria de prever. Mas o que deixa o público entre a perplexidade e o riso são os rituais daquela seita, em que educam as crianças para quererem morrer por Jesus e pela pátria, para apenas desejarem da vida a morte para ir pró Céu, para reunirem um exército contra "os males do mundo", como o aborto. A maioria das famílias evangelistas educam os filhos em casa segundo as ideias do Criacionismo e da Evolução, as quais postulam que a ciência é um monte de balelas, e que Deus criou o Homem por obra e graça do Espírito Santo (que ironia tão blasfema).
E o pior é que Bush apoia esta igreja e até defende que se devia ensinar o Criacionismo nas escolas americanas, laicas por natureza. Ouvimos no filme o discurso de um dos seus militantes, que por apoiar a igreja confessa ganhar uma grande parte do voto dos americanos para o partido de Bush.
É simplesmente chocante e ridículo, estes grupos fazem as crianças acreditar que ouvem vozes dentro de si e se devem privar da televisão e dos brinquedos porque tudo é pecado. O momento alto é quando uma criança afirma que deve ser uma honra ser mártir por Deus e pelo país, e quando Betty demonstra que está a criar um exército, porque tal como os Muçulmanos ensinam as crianças a mexer com bombas, Betty dá-lhes a ilusão de que podem mudar o mundo se fizerem tudo por Deus (até matar?). Enfim. Nem sei que diga. Desconhecia esta realidade. Mais uma prova como as religiões são simplesmente estúpidas.